Cancro da mama

Novo Marcador de Prognóstico do Cancro da Mama
André R. Silva


Fig 1 - Mamografia – zona de hiperdensidade

O cancro da mama é hoje, no mundo ocidental, a forma mais comum de cancro em indivíduos do sexo feminino afectando uma em cada nove mulheres em algum momento das suas vidas. Muitas vezes a identificação de uma hiperdensidade na mamografia é o primeiro achado sugestivo de uma lesão. Por si só este achado representa um aumento de duas a seis vezes do risco de desenvolvimento de tumor na mama. Pensa-se que está associada a uma alta concentração de colagénio que parece preceder a formação tumoral.

Na progressão tumoral ocorre ruptura da membrana basal seguida de deposição e reorganização de nova matriz estromal após recruta de novas células. Segue-se a invasão de células tumorais para o estroma. Existe uma crescente evidência da influência da organização e função estromal na invasão e estabelecimento de metástases tumorais. Neste contexto, vários estudos foram capazes de comprovar a hipotética associação do colagénio a esse processo. Matthew W. Conklin et al no estudo “Aligned Collagen Is a Prognostic Signature for Survival in Human Breast Carcinoma” foram capazes de associar a estrutura e organização do colagénio á volta do limite tumoral com o prognóstico do cancro da mama. De facto, embora muitos avanços se tenham verificado recentemente relativamente á obtenção de um diagnóstico e estadiamento deste tipo de cancro, na verdade ainda se verificam muitas situações em que a previsão de sobrevivência baseada nos biomarcadores existentes como o ER, PR e HER-2, é difícil uma vez que estes podem estar ausentes (doentes triplo negativos) . 

Esta investigação usou uma nova classificação para a organização e estrutura do colagénio em redor dos limites tumorais denominada “tumor associated collagen signatures” – TACS. De acordo com esta classificação TACS-1 refere-se a um aumento localizado da deposição de fibras de colagénio perto da lesão tumoral.

Com a progressão tumoral ocorre uma organização e alinhamento do colagénio de forma paralela em torno dos limites tumorais – TACS-2. 

Por fim o último nível, TACS-3 refere-se á disposição em aglomerados de fibras de colagénio perpendicularmente aos limites tumorais. Este estudo foi capaz de provar que os locais onde o marcador TACS-3 estava presente coincidiam com invasão de células tumorais para o estroma.

Fig 2 –Imagens em SHG de TACS-1, TACS-2 e TACS-3

Uma técnica imagiológica recente, denominada “Second Hormonic Generation” (SHG), capaz de identificar especificamente as fibras de colagénio e o seu nível organizacional constituiu um ponto chave na procura deste novo marcador de prognóstico do cancro da mama. Basicamente, o SHG é uma técnica em que dois fotões interagem com a estrutura não contromérica do colagénio de tal forma que os fotões resultantes tenham metade do comprimento de onda dos incidentes. É uma técnica que dispensa corantes ou fluorescência e capaz de produzir uma imagem somente pela presença de colagénio sendo influenciada não só pelas suas propriedades mas também pelo grau de cruzamento, espessamento, sobreposição e alinhamento das suas fibras. Esta técnica não é influenciada pela presença de colorações prévias ou forma de fixação das lâminas pelo que é possível submeter amostras previamente coradas. Estruturas de colagénio altamente organizadas produzem um sinal de SHG muito mais intenso do que estruturas menos organizadas. Sendo assim, pela primeira vez foi possível distinguir de uma forma fácil e precisa o colagénio proveniente de uma resposta desmoplástica do estroma às células tumorais do colagénio fibrilar disposto desordeiramente no estroma. Na figura 3 é possível observar dois cortes, ambos com abundante colagénio disposto na matriz que no entanto produzem sinais de SHG muito diferentes, indicando que as imagens da figura da direita são de um colagénio mais organizado e alinhado.

Fig 3 – Tumor da mama; A e B cortes em H e E ao microscópio óptico; C SHG de A; D SHG de B

Através do cruzamento destes conceitos foi possível concluir que a presença de TACS-3, observada em tumores da mama através da técnica SHG, se relacionava positivamente com um pior prognóstico do que a sua ausência. Mais ainda, foi possível perceber que a presença de TACS-3 era independente de outros marcadores pré-existentes. O estudo referido permitiu ainda perceber a elevada potência desta técnica uma vez que pequenas áreas de tecido com TACS-3 tinham um forte valor preditivo o que abre caminho para a utilização desta técnica em situações em que não é possível analisar todo o tumor. Colocou-se a hipótese de que as células tumorais “usam” as fibras alinhadas de colagénio, denominadas “auto-estradas de colagénio”, para invadirem os tecidos adjacentes. Esta teoria foi suportada pela correlação positiva que foi estabelecida entre a presença de TACS-3 e de Syndecan-1 nas amostras estudadas. Foi provado previamente que o Syndecan-1 estava sobre-expresso nos fibroblastos resultantes da resposta desmoplástica do estroma ás células tumorais e como tal associado a um mau prognóstico no cancro da mama. De facto observou-se que os fibroblastos positivos para este proteoglicano produziam colagénio alinhado e altamente organizado. 



Fig 4 – Biopsias de tumor da mama; A e B – cortes em HE ao microscópio; G e E imagens em SHG e fluorescência de A respectivamente; H e F imagens em SHG e fluorescência de B respectivamente

Na figura 4 é possível observar notáveis diferenças no alinhamento do colagénio sendo que o tumor da esquerda (A, G e E) apresenta um colagénio disposto paralelemente ao limite tumoral enquanto que o da direita apresenta uma disposição perpendicular. Adicionalmente o tumor das imagens da direita (B, H e F) apresenta um colagénio mais organizado produzindo um sinal de SHG mais forte. Tudo indica que o tumor nas imagens B, H e F oferece um prognóstico significativamente pior do que o presente nas imagens da esquerda. 

Portanto, estamos perante um novo biomarcador capaz de ajudar a prever com segurança o outcome de doentes com cancro da mama. Este marcador é independente de outros marcadores já existentes podendo-se aplicar com forte poder preditivo a todos indivíduos sem excepção. Por ser extremamente potente pode ser usado mesmo quando as amostras são pequenas e atendendo ás características de robustez e estabilidade do próprio colagénio estão abertas as portas para uma utilização mais alargada desta técnica. 

Esta investigação vem claramente alargar o campo de visão no que toca à procura de novos tratamentos capazes de travar o cancro da mama possivelmente interferindo na reorganização do colagénio. Estudos estão a decorrer no sentido de associar está técnica a outos tumores.



Bibliografia 
  • Conklin MW et al (2010)Aligned Collagen Is a Prognostic Signature for Survival in Human Breast Carcinoma; Elsevier Inc. DOI: 10.1016/j.ajpath.2010.11.076 
  • Rubin, R; Strayer, D – Rubin`s Pathology, 6a ed; 2012 
  • Ross, Mh. Paulina W. - Histology. A Text And Atlas. Lippincott Williams&wilikins. 6ª Edição. 2011 
  • Mescher, Anthony L.; Junqueira's Basic Histology - Text and Atlas. McGraw-Hill Medical; 12th edition (August 28, 2009)



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